001 Trocando processadores

I.
No laboratório, após já termos tirado a concentração de todos pela constante movimentação de diversos gabinetes para encontrarmos um com o maior número de slots para memória, Hello Kitty e eu nos esforçamos para fazer os pininhos do processador encaixar no slot dele.

- Léo, você sabe como fazer isso? Então me ensine, que eu não sei.
- Olhe que legal que é a parte de baixo.
- Nossa, é muito lindo.
- Imagine pentear o cabelo com isso. "Olá, meninas! Hoje vamos aprender a pentear o cabelo usando um processador."
- "É uma excelente técnica para tirar o frizz".
- "Estão vendo esses pininhos? são banhados a ouro, ótimo para o cabelo."
- "Você pode usar o processador do computador que tiver em casa, pode ser o que seu irmão usa, não precisa ser de última geração."
- "É isso mesmo, não vai precisar gastar nada, depois ensinamos a colocar de volta." Pronto, parei.
- Ai, Léo. Tem lado certo para encaixar?
- Tem sim, veja este triângulo desenhado numa das pontas.
- Será que encaixou?
- Não está entrando, Kitty.
- Mas o modelo do slot é o mesmo. Não tem como ser de outro jeito? Não entra assim, já tentei.
- Kitty. Joga para cima e vê se ao cair encaixa. (Risos contidos.)
- Está me desconcentrando!
- E se fizermos força para encaixar?
- Acho que não é uma boa ideia.
- Óóó, DESCOBRI! Não está entrando porque, veja, a última fileirinha de pinos não está alinhada. Acho que entortamos.
- Dá aquele clipes ali.
- Não. O que vai fazer?
- Vou desentortar.
- Eu não quero ver isso. É contra lei do bom senso. MEU ZEUS, PARE COM ISSO. AI, NÃO QUERO VER. Não estou nem mais aqui.
- Se funcionar, desisto do meu curso, que não é possível. Consegui desentortar cinco.
- Falta muito ainda. Deixe-me tentar. E se enfiarmos a última fileirinha primeiro e, encaixados os pinos, forçamos para outro lado? Aí, desentortou metade. Agora a outra fica por você.
- Funcionou. Cadê o clipes?
- Você não quer usar logo esse alicate? Eu desisto. (Passo a tentar usar um alicate para cortar uma lasca de unha que prendi pouco antes. As pessoas no laboratório fingem não estarem acompanhando.)

II.
Chega ao laboratório um professor-pesquisador que tem fama entre alunos de ser grosseiro.

- Aí, olhe quem chegou.
- Para com isso, Léo.
- Ó, se ele vier, você finge que quer tirar uma dúvida de elétrica. Estou falando sério.
- Não vou fazer isso. Estou nervosa.
- Olhe, já cumprimentou a metade. Acho que está ignorando "os loucos ali". Você está rindo muito, ele vai vir mais rápido.
- O que vamos dizer se ele perguntar?
- Estamos consertando o computador, caso ele pergunte. Já não estava funcionando. É sério, assuma isso.

(Professor:)
- E vocês? estão pondo para funcionar?
- É isso mesmo!
- Vocês conhecem dessas coisas?
- Sim, já fizemos curso disso.
- Ah, que bom. Estava para mandar dois que tenho para um técnico olhar. Mas estou pensando... será então que poderiam vê-los antes? O problema parece ser blá-blá-blá-blá.
- Ah... a gente podia ver.
- Ok, então.

III.
- Desculpe, Hello Kitty. Não foi minha intenção.
- Eu nem sei o que dizer para você. "Fizemos curso disso!"
- Mas fizemos mesmo. Aliás, qual era o problema dos PCs dele?
- Não faço a menor ideia, me perdi totalmente, nem sei que componentes eram aqueles.
- Tá, agora já foi. Estude.

IV.
Distraio-me com os objetos que estão sob a mesa.
- Olhe só, a caneta digital que o pessoal dos desenhos usa. Empreste o processador.
- Falta desentortar muito ainda. O que está fazendo?
- Sucesso. (Estou desentortando com a outra ponta da caneta.)
- Acho que está entortando para o outro lado.
- Prontinho. Vai funcionar.
- Nossa, ficou bom mesmo.

*Barulho meio alto demais para ser de um encaixe de processador*

- Geeente, não acredito que encaixou! Agora você que parafuse o dissipador.
- Se funcionar, sério, não faz sentido, isso é muito sensível.
- Se funcionar, eu que não uso esse computador. Toma, a pasta térmica.

Fim do drama, o computador ligou.

Acho que temos que ser mais discretos quando há pessoas na sala. Logo nossos diálogos vão parar na Internet. Que pelo menos eu já tenha feito isto antes.